Postagens populares

domingo, 2 de outubro de 2011

O impiedoso Cortázar...


DEDICATÓRIAS PICANTES E DURAS CRÍTICAS: AS ANOTAÇÕES NOS LIVROS DE CORTÁZAR  

Guido Carelli Lynch, Revista Clarin
Traduzido por Ana Elisa Prates



Lançado Cortázar e livros, que analisa a biblioteca do autor de Amarelinha. Nas margens, o autor corrigia as erratas com obsessão. E criticava sem piedade. 

Você tem uma biblioteca? Ordena seus livros seguindo algum critério? Por ordem alfabética? Por nacionalidade? Por ordem de chegada? Por gênero? Os organiza porque é cuidadoso ou porque é obsessivo? Marca seus livros? Sublinha com lápis ou caneta? As bibliotecas guardam segredos sobre seus proprietários. Se o leitor em questão é Julio Cortázar, tudo se torna muito mais interessante.

O pesquisador espanhol Jesus Marchamalo esmiúça em Cortázar y los livros (Fórcola) a biblioteca pessoal do autor de Amarelinha, que Aurora Bernádez, primeira mulher e inventariante do autor, doou para a Fundação Juan March, de Madri, em 1993. Por enquanto o livro só está disponível na Espanha, mas parte da investigação as páginas marcadas por Cortázar podem ser vistas em: 
http://cvc.cervantes.es/literatura/libros_cortazar/defaut.htm .

A maior parte da biblioteca é dedicada à literatura. Há poesia, romance, contemporâneo, ensaios literários, biografias e literatura fantástica, a qual Cortázar era devoto. “Corrigia erratas, anotava nas margens, e escrevia comentários, que mostrava o seu acordo ou desacordo com o que lia”, explica Marchamalo. As anotações estão quase sempre no idioma do livro em questão (francês, espanhol, inglês e alemão). As erratas são uma obsessão persistente de Cortázar. Na edição de Paradiso, de José Lezama Lima, pergunta: “Por que tantas erratas, Lezama?” E em Confieso que he vivido, escreve a Miguel Otero Silva, editor do livro: “Tchê, Otero Silva, que maneira de corrigir o manuscrito, porra!”. 

As dedicatórias são um capítulo à parte. Há autógrafos de Garcia Marquez, Calvino, Carlos Fuentes, Onetti. O favorito de Marchamalo é o do Nobel mexicano Octavio Paz “A Julio, mais perto do que longe, num ali que é sempre aqui”. Pablo Neruda também o autografou alguns livros. Vargas Llosa, da mesma forma. Em La casa de Verde, em julho de 1966 anota: “A Julio e Aurora, os primeiros leitores do romance de cavalaria com toda a admiração, gratidão e carinho”. Nas Cronicas de Bustos Domecq, Adolf Bioy Casares escreve: “Para Julio Cortázar, afetuosa lembrança com meus efusivos parabéns pelas admiráveis narrações e contos de Todos los fuegos el fuego”. 

Muitos dos livros de Cortázar acusam seus caprichos do leitor: estão danificados e desencapados. Os de Borges – com quem teve uma relação complexa, mas de admiração estão intactos, apenas com alguns sublinhados ocasionais. “Há outro - diz o pesquisador- em que uma só marca é vista, como se não tivesse lido”. Entre eles, estão autores como E.M. Foster, Faulkner e Salinger. 

Entre as raridades, sobressaem desenhos e a suástica com uma exclamação em Anthologie de l”humor noir de André Breton. Há também ausências notórias. Como Miguel Delibes, Benito Pérez Galdós ou Manoel Puig. Estas faltas talvez se devam por suas mudanças entre Argentina, França e Espanha. Entretanto teve o cuidado de conservar uma edição de Opium , de Jean Cocteau, de quando era crianças. E há muito de Felisberto Hernández, e muita poesia de Luis Cernuda e Frederico Garcia Lorca. 
 

Nenhum comentário:

Postar um comentário